domingo, 11 de novembro de 2012
terça-feira, 6 de novembro de 2012
O CARISMA FRANCISCANO
1. Inspiração e sistema-eixo: restaurar a Igreja vivendo segundo a forma
do santo Evangelho
Carisma: “força divina conferida a uma pessoa, mas em
vista da necessidade ou utilidade da comunidade religiosa. Qualidades especiais
ou conjunto destas” (Dicionário).
Francisco nasceu em 1182
Ajudou na construção dos muros da cidade livre (Assis)
em 1200;
Foi à guerra entre Perusa e Assis, 1202 (aos 20 anos),
preso em Collestrada;
Depois de quase um ano, doente, foi libertado pelo Pai
em 1203;
Caiu vítima de longa enfermidade, 1204;
Deus abria espaço em sua alma... (1Cel V)
Francisco teve momentos fortes de busca, de escuta da
voz de Deus. Deus lhe fala em sonhos,
nas situações existenciais, no crucificado em São Damião e
principalmente através da mensagem
evangélica.
A partir daí, Francisco alimenta a convicção profunda
de que o Senhor lhe chamou: “O Senhor me revelou....”; “o Senhor me
deu irmãos...”(Test. 14). E mesmo sentindo segurança com tais experiências, ele
leva
anos para tomar consciência clara dos desígnios de Deus sobre ele e da
missão que lhe era confiada. Foi longo processo de maturação evolutiva.
Em 1205
Francisco prepara-se para ser armado cavaleiro, sua maior ambição. Vê em seu sonho um magnífico castelo cheio de armas
e uma noiva belíssima. Tudo seria seu e de seus companheiros. Fica exultante.
Toma o sonho como presságio de êxito (1Cel 6). Mas outra noite enquanto dormia
na cidade de Espoleto, uma voz lhe pergunta: “quem poderia oferecer-te mais
vantagens, o servo ou o Senhor?” Francisco responde: “o senhor!” E a voz: “por
que então procuras o servo em vez do Senhor?” E Francisco: “Senhor, que queres que eu faça?” E a voz: “regressa para a terra
de teu nascimento ..., porque lá a visão que tiveste realizar-se-á numa
dimensão espiritual” (2Cel 6). Francisco volta
para Assis, se retira a lugares solitários,... reza, medita: “Senhor que
queres que eu faça?” um dia na igrejinha de S. Damião, o Cristo do crucifixo lhe fala: “Francisco, vai e restaura a minha casa
que, como vês, está em ruínas” (2Cel 10). Francisco de repente pensa: “Ah! É isto que Deus quer de mim!” E
restaura igrejas abandonada. Depois pensa e medita: “que igreja Cristo quer que eu restaure?” Descobre que é preciso restaurar a Igreja povo, Sociedade. Mas como fazer isso? Como concretizar o
projeto de vida há tempo existia em seu coração?
A
resposta veio após a escuta da Palavra de Deus no Evangelho proclamado na
Igreja (Mt 10; Mc 6; Lc 9 e 10). Foi aí que se deu o estalo e seu coração
se sensibilizou a mudar de vida: “É isto
que eu quero, é isto que eu procuro, é isto que eu ambiciono de todo o coração”
(1Cel 22). A idéia, a intuição, a inspiração que tem naquele instante dar um
rumo decisivo à vida de Francisco. Tudo
o resto gira em torno disso. É a partir disso que sempre se parte para
descobrir a inspiração primigênia, o sistema-eixo da vida, do carisma e da
espiritualidade de Francisco, sua missão e seu movimento na Igreja, o caminho,
os agentes e os marcos normativos.
Mas, interpretações diversas acerca do carisma já
surgiram contemporaneamente ao fundador. A tendência pauperística: “viver na pobreza, sem ouro, nem prata e nem cobre”.
A clericalista:“assumir a missão dos
apóstolos, ser clérigo, tonsura, privilégios.”
Francisco não
queria apenas viver a pobreza, nem ocupar cargos nem lugares privilegiados, não
queria ter poder nas mãos, não queria sentar à direita ou à esquerda de Cristo.
Ele sentia que viver segundo a forma do santo Evangelho era ocupar o último
lugar, pôr-se a serviço de todos, ser menor e fraterno como Cristo que veio
para servir é não para ser servido. Era renunciar a si mesmo e não ser armado
cavaleiro, era renunciar a seus sonhos de grandeza e não passar para a classe
dos nobres, era tomar a sua cruz e seguir Jesus. Era promover a paz no meio dos
conflitos humanos, religiosos e sociais. Era vender tudo, não ser comerciante
ou dono de feudos, dar aos pobres e seguir Jesus. Não era fugir aos leprosos e
doentes, era curar-los, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos (Mt 10,8).
Aproximar-se, aceitar-los e cuidar deles. Enfim, era mudar de lugar social e
sentir-se bem entre os pequenos, pobres e doentes, leprosos; era ser menor,
solidário e fraterno (Test 2).
E a razão
profunda que levou Francisco a isso, era o convite de Cristo no Evangelho e na
oração/meditação: “Francisco, vai e restaura a minha casa que, como vês, está
em ruínas” (2Cel 10). Então, viver
segundo a forma do santo Evangelho foi a maneira que Cristo inspirou a
Francisco para viver sua vocação: restaurar
a Igreja e transformar a Sociedade... “E tornar a sociedade uma grande
família de irmãos” (Crocoli, p.87). Esta “é a inspiração primigênia e central
do Carisma franciscano” (Fr. Jaime, p. 07). Assim, o núcleo central de nosso
carisma é um modo de ser, de viver, capaz de transformar e restaurar as relações em vista da solidariedade e fraternidade, em vista de uma paz
verdadeira fundada no amor. É a missão
da paz conforme seus biógrafos (Crocoli, pp. 87-88). Esta missão leva
Francisco a ultrapassar as fronteiras da Igreja, do Cristianismo, e as
fronteiras do humano, e chegar à dimensão cósmica.
Só
que esse modo pacífico de ser, precisa
necessariamente passar pela mediação da fé, da conversão profunda,
concretizando-se num projeto de vida descentrado
de si mesmo e impregnado pela dinâmica do amor que vai até os mais ínfimos
espaços para restaurar o homem, e preservar toda forma de vida (Crocoli,
p.73-79).
2. O caminho para viver segundo a forma
do santo Evangelho e transformar a sociedade é a Minoridade
No carisma franciscano a Minoridade é um dos
componentes básicos. Compreende: pobreza e mudança de lugar social,
desapropriação absoluta, atitude de peregrinos e forasteiros, espírito de
serviço e trabalho.
2.1- Pobreza e mudança de lugar social
Francisco não define a pobreza, “quis ser pobre por
que o Senhor se fez pobre por nós neste mundo” (RB VII). Pobreza para ele não
era ascese. E sim mudança de lugar social, era conseqüência do amor a Cristo
pobre. Exemplo disso é: “O Verbo do Pai que quis com a Virgem Maria escolher a
pobreza”(2Fi). Francisco assume a pobreza-kenosis de Cristo: “esvaziamento dos
esplendores divinos para colocar-se disponível nas mãos do Pai a serviço do ser
humano”(Fil 2,6-8).
Segundo Frei A. Fragoso, OFM, os biógrafos não
conseguem chegar a um acordo sobre qual terá sido o amor maior de Francisco:
“se o Cristo feito pobre na cruz, ou se o pobre feito Cristo na terra” (Rev.
Fcana. vol. I, n. 1e2, 2001, p. 46).
2.2- desapropriação absoluta
A fé revela a Francisco que Deus é o Sumo Bem. Daí
todos os bens pertencer a Ele. “Não nos pertence senão os nossos vícios e
pecados”(RB VI). Para Francisco, a desapropriação externa é condição para a
desapropriação interna e para a total disponibilidade para servir. O verdadeiro
pobre se fia em Deus (Adm XIV). É uma desapropriação não em sentido jurídico,
mas em sentido evangélico, comunitária (RBVI). Deve-se considerar sempre “servo
inúltil”(Lc17,10). Pois os inimigos principais da pobreza e da união fraterna
são o egoísmo e o individualismo. Estes criam distâncias entre as pessoas.
2.3- Atitudes de peregrinos, itinerantes
Quem tem a segurança nas mãos do Pai celestial, quer
como Cristo, ser pobre, desinstalado, não ter onde repousar a cabeça (Mt 8,20),
quer sempre estar totalmente disponível para o Reino de Deus. Daí Francisco não
querer instalação, mas “viver numa atitude de peregrino e forasteiro neste
mundo, servindo a Deus na pobreza e humildade (RB VI), à maneira dos apóstolos
enviados dois a dois” (1Cel 29).
Com isso, Francisco rompe os muros das clausuras e
funda uma nova vida religiosa, popular e apostólica, em seu tempo, no meio do
povo (Baldomero, I, p. 757). Daí a característica do Frade Menor ser: viver
desinstalado neste mundo a exemplo da Igreja peregrina, e sendo sinal escatológico
da vida que há de vir.
Foram as exigências dos tempos para a formação dos
candidatos à Ordem que obrigaram os franciscanos a terem moradias estáveis. Mas
continua o apelo a não assumirem compromissos contra a itinerânça.
2.4- Espírito de serviço e minoridade
Não
ostentar da própria pobreza e desistalação, “mas preferir cada um julgar e
desprezar a si mesmo” (RB II). Para Francisco, ser menor era achar-se com gosto
entre pessoas humildes, pobres, doentes, e abandonadas; era mudar de lugar
social; era amar, ter estima e admiração para imitar Cristo servo (Mt 20,28).
Isso exige renúncia do “eu” após ter renunciado o “meu”.
A
pobreza-minoridade é a disposição face ao Altíssimo: “Quem sois Vós e quem sou
eu?” A verdadeira humildade é situar-se na verdade, que somos frágeis, mas
valorizar as potencialidades e colocar-se a serviço na alegria perfeita.
2.5- Espírito de trabalho
Na
tradição monástica, o valor atribuído ao trabalho era ascético: “evitar o ócio
e vencer as tentações” (RB V). Francisco tem um concepção mais evangélica e
mais moderna, vendo o trabalho em função da fraternidade e da minoridade. O
trabalho para ele é uma graça (RB V; Test. 20-21), é algo próprio dos servos e
de quem exerce uma profissão para o sustento humano (contanto que seja trabalho
honesto/RnB VII), levando em conta os dons recebidos de Deus. Então o trabalho
é o meio normal de subsistência do frade menor e do homem. “Não socorrer aos
necessitados é um furto”. Deve-se ter uma disponibilidade minoritica de
“diaconia” a serviço da família humana. Renunciar a uma justa remuneração é
anti-social o trabalho deve ser uma prática de solidariedade humana na busca
dos valores espirituais do Reino dos céus (RBV).
Este é um dos elementos mais significativos do carisma
franciscano. “Antes de descobrir a fraternidade, Francisco descobriu o irmão.
No irmão-homem revelou-se Cristo-irmão. E através de Cristo e seu Evangelho
Francisco foi absorvendo o sentido pleno da paternidade Universal de Deus e
família dos filhos de Deus, que irmanam os batizados, os homens todos e a
criação inteira” (Fr. Jaime, p.16; Mt, 6,9; 23, 8 -9). A fraternidade
franciscana é a que une os homens no amor do mesmo Pai e em beneficio da mesma
salvação integrada pelo Espírito Santo.
A comunidade
beneditina com seu “Ora et Labora” tinha sua regra, a agostiniana e premonstratense,
tinham as suas regras: a vida comum com
unidade externa e interna dirigida com um superior, pai. Na fraternidade franciscana a única coisa que os frades tem para pôr em
comum é o amor fraterno. A única
força de coesão e segurança de vida, na confiança na Providência divina.
Aqui os atos em comum (oração, refeição) são momentos fortes de encontros e de
convivência fraterna. É uma fraternidade
sem superior nem pai, feita só de irmãos
que cuidam uns dos outros. Daí seu
carisma ser itinerante e missionário, que reúnem em fraternidade para viver
a forma do santo Evangelho no mundo pregando a paz, numa comunhão intima
independente da distância geográfica, e aberta para todos os homens e mulheres e
criaturas do universo. “Pois Francisco percebia com agudeza as coisas ocultas
do coração das criaturas” (ICel 81).
4. Os marcos normativos do movimento
franciscano
Modelo concreto: Deus, o Sumo Bem e Cristo; o Espírito
Santo e sua santa operação; submissão a Igreja Romana e a liberdade filhos de
Deus.
(Fonte: BIAZUS, Frei Jaime, OFMCap. Carisma Franciscano. Brasília-DF)
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